Saiba como a dependência em redes sociais pode comprometer a saúde física e emocional de indivíduos que apresentam a compulsão
TEXTO E ENTREVISTAS RAFAEL DE TOLEDO/COLABORADOR DESIGN GUILHERME LAURENTE/COLABORADOR
Quem nunca se viu animado com a notificação de alguma menção de seu nome ou mensagem no Facebook? Com o avanço da tecnologia, as redes sociais tomam parte da rotina com a vantagem de manter as pessoas conectadas aos acontecimentos dos seus círculos sociais. No entanto, a quantidade de funcionalidades e informações provindas dessas plataformas pode interferir diretamente no comportamento humano. Isso porque os indivíduos se esquecem de que tais fatores podem ser distanciadores da vida social, justamente a proposta inicial das redes.
Como se torna um vício?
A grande dificuldade quando se encara uma situação de dependência é, por vezes, a falta de consciência de que aquilo afetará tanto a vida profissional quanto social e amorosa. Assim como percebido por um estudo realizado em 2013 pela Universidade de Chicago, nos Estados Unidos, o vício em internet supera aquele apresentado com drogas lícitas, como o cigarro e o álcool. Tal dado é enfatizado pela psicóloga Melcina Moura. “Essa dependência gera uma irresistível necessidade de se expor nas redes sociais, conectando-se a outros amigos virtuais que são recíprocos”, completa a profissional.
Relação com a depressão
Segundo uma pesquisa realizada pela Universidade de Pittsburgh, nos Estados Unidos, pessoas tidas como viciadas em internet podem apresentar o triplo de possibilidade de futuramente desenvolver um quadro depressivo (a estimativa é de que esse número seja 2,7 vezes maior). Isso foi percebido com a análise de um grupo de 1,8 mil pessoas em uma faixa etária que variava de 19 a 32 anos.
Mesmo com a análise não afirmando que a depressão acomete indivíduos com vício em redes sociais, o transtorno pode se manifestar como um dos sintomas do distanciamento gerado entre o indivíduo e seus próximos, como enfatizado pela psicóloga Dora Góes. “O indivíduo passa pelo isolamento social e deixa de cumprir com as atividades diárias. Além disso, a pessoa também passa a dormir menos, afetando, desse modo, a sua produtividade".
Com isso, as práticas que mantêm a dependência são aquelas inerentes às redes sociais: os likes, os balões de mensagens preenchidos com notificações, os comentários que gerarão visualizações, etc. “A pessoa não administra o seu tempo de produtividade, de repouso, de realidade. Vai sucumbindo a ver perfis, curtir, comentar e, principalmente, inventar situações para fazer parte de um grupo”, como cita Melcina.
Prejuízos
Em 1996, a psicóloga estadunidense Kimberly Young, especialista em comportamento de indivíduos viciados em internet, definiu algumas manifestações percebidas até hoje nos subgrupos da Dependência de Internet (DI), problemática essa que abarca vícios específicos, como aquele voltado ao sexo virtual e a jogos eletrônicos (leia mais sobre o tema na página 12) .
Há alguns aspectos que cercam as categorias que formam essa dependência, como a fadiga causada por um sono inconstante, sinais de abstinência (como raiva e impaciência), além da regulação emocional ocasionada apenas pelo uso de dispositivos que acessam a internet.
Segundo a psicóloga Veruska Santos, “dependentes de internet criam necessidades para retornar ao computador quando estão offline e o uso da tecnologia impacta significativamente seu tempo e seus pensamentos”. Isso porque a dopamina, hormônio que contribui com a felicidade, possui uma descarga muito maior em áreas cerebrais em comparação à atividade das mesmas durante a leitura de um livro, como cita a profissional.
Tratamento
É necessária a conscientização do uso abusivo, como menciona Veruska, para que o indivíduo tenha discernimento de sua condição. No entanto, até chegar lá, há uma fase de negação do usuário, a qual é combatida com diálogo entre familiares e grupos de apoio (entenda melhor sobre psicoterapias na página 16).
“Estudos já comprovam comprometimentos de atenção, memória e concentração em dependentes de internet. Se não modificarmos a maneira como estamos usando a tecnologia, teremos muitos danos em funções executivas e, principalmente, nas interações sociais”, conclui a profissional.
Box: PESQUISAS NO BRASIL
Segundo a Associação Brasileira de Telecomunicações (Telebrasil), o número de acesso às redes móveis de dados para internet bateu a marca de 200 milhões e apresentou, no ano de 2017, 202 milhões de acessos. Esse dado é importante para compreender uma realidade que vem atingindo milhares de brasileiros: o vício no mundo virtual, especialmente devido às redes sociais.
Mesmo não havendo um grupo específico, as pesquisas notam maiores índices de dependência de internet e, consequentemente, de redes sociais, entre jovens e adolescentes que figuram como grupos recorrentes em projetos destinados ao tratamento do vício. Segundo Dora Góes, essa é uma classe que possui vulnerabilidade e tende a apresentar adição em diversos níveis. “Nota-se que os adolescentes procuram suas tribos nas redes sociais, ou seja, o lugar onde podem encontrar ‘aceitação’ social – o que muitas vezes não encontram fora do mundo digital”, complementa Melcina Moura.
Uma análise realizada pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), por meio do Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br), revela que 80% da população brasileira, com faixa etária de nove a 17 anos, utiliza a rede de internet, com aumento no número de vezes que estão conectado durante um dia – saltando de 21%, referente ao estudo de 2014, para 66%, com dados de 2015. A pesquisa ainda se debruça para saber o percentual de usuários das redes sociais, sendo 78% dos entrevistados ativos em comunidades de relacionamento na web, como Facebook e Twitter. Assim como Melcina conclui, “a progressão obedece o mesmo caminho de todas as dependências, ou seja, quanto mais conexão, maior será a necessidade de estar conectado”.
CONSULTORIAS Dora Góes, psicóloga e membro do grupo de Dependência em Internet, vinculado ao Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas, da Universidade de São Paulo; Melcina Moura, psicóloga e coach especialista em relacionamento pessoal; Veruska Santos, psicóloga clínica e especialista em Terapia Cognitivo– Comportamental.
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